quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

APENAS SIGA

Ela gritava dentro de si enquanto preenchia a face alheia de risos, enquanto se fazia piada. Ela praticamente morria. Cada um no seu mundo, enquanto o nosso mundo em chamas ardia sobre suas falas reclamonas “mas essas pessoas precisam tanto de alguém?” “Reclamam, mas diante do bicho se omitem” “Que medo é este do Bicho Papão” e uma voz lhes respondia na consciência:

 - Querem se manter ali onde estão
 - E por que não mudam – Ela se perguntava
 - Mudar não é fácil, preferem que “mudem por nós” e “nos mudem também”

 E depois silenciava, cada vez que se aprofundava no nós, se aprofundava em si, cada vez mais a posição dos outros lhe eram complexas, a quem amara agora lhe era contrário, e cada vez mais em sua solidão entrara.
Belo dia se deu ao trabalho de se unir aos corpos, vieram lhe beijos longos que ela amara num raio de segundo, e depois, em algum canto se sentira abandonada.
Mas por belos dias os corpos lhe eram bem vindos, alguns não demonstravam a mutilação dos seus corações nas presas, outros, lhe eram expressivos.
Há os corpos que ela se importara mais, e outros menos.
Era meio puta e santa e amava a isso tudo.
Mas belo dia, alguém lhe viera, e se combinara, num filho, e depois viu-se largada com um filho na barriga... seu coração conflitava entre auto mutilação e esperança.
“Estive completamente só por anos, carregando fardos pesados, e me vem um que de tão pesado me trata com leveza?”
E a voz lhe dizia:

 - Filho e trabalho
-  Meu filho é o melhor dos meus trabalhos
 - Sim, mas como vai sustenta-lo com toda essa energia?
 - Sou mulher! Mãe! E não será por isso que serei uma serva, uma escrava, não venderei a minha vida e a vida do meu filho numa bandeja

Ah! Mas o amor alheio somente na cabeça e nas palavras é meio amor, e pouco foi o amor que desabrochou em ato, em certos casos, valeram-lhe mais o canto dos ventos nas folhas das árvores conversando com seus sentidos a magnitude das ondas a preguiça das manhãs cinzas ou o canto de um pássaro lá longe, do que aquilo que estava na mente das pessoas
Derrubar uma vida sem sentido é difícil, uma carregada de um amor no útero e outro com os pés no chão se torna praticamente impossível “Não, um sentimento qualquer não abala”
A tal voz retornava:

 - Os sentimentos podem ser a coisa mais maravilhosa do mundo mas a pior delas
 - Isso é óbvio para que eu pense assim

“Mas meus dias passaram, vieram outros corpos, aprendi abandoná-los como aprendi a ser abandonada, não me importa, existe uma vida que cresceu e agora caminha, e seus olhinhos me fitam e são doces, oh! Como é maravilhosa a vida, e como tais olhinhos são amados, são férteis, guiam em parte os meus”
E ela deixou-se levar pelo fluxo do dia a dia, na luta contra a servidão imposta, que queriam lhe fazer engolir como uma condição natural da vida, fora traída por vezes nessa luta, surpreendida pelas omissões alheias, mas tudo valia a pena quando a noite encontrava sua menina crescida.
“Nem mesmo a violência dos furacões a energia cinética dos maremotos ou mesmo uma guerra maldita não nos pegam com tamanha surpresa e nos deixam um vazio vasto quando alguém que amamos se desfaz, pétala a pétala, sorvendo gota a gota de nossas lágrimas vorazes. Amar a si mesmo, amar a nós, não deixa de existir, mas muda!”
Então aquela menina que um dia carregara em seu útero, numa doença súbita fora levada há um ponto tão triste que se torna covardia um artista tentar descrever, nesta hora é melhor mudar o foco da câmera. E a voz lhe dizia:

 - A pedra cai sobre seus ombros
 - O que faço?
 - O que lhe liga aos outros?

“Uma vida qualquer, sem sentindo, moribunda a minha, que busca em si e nos outros um sentindo, ah! Quantas perdas, vale a pena toda uma guerra só para se ter o status de vencida? Vale a pena dizer que venceu diante de tantas tragédias sobre o cano de uma arma quente? E quando o absurdo chega a pontos extremos, o que fazer? Busquei lhes de volta, amor, perdoe, não me abandone mais.”

E uma voz tímida, quase inaudível, abalada e sem força, lhe dizia em forma de conceito consciência:

 - Apenas Siga!

Rio de Janeiro, 11/12/2014
Maria Catarina



Nenhum comentário:

Postar um comentário