terça-feira, 18 de agosto de 2015

Por que você quer fazer isso?

Por que você quer fazer isso?

Estávamos embriagados com o vinho barato e o cheiro de nossa embriaguez se misturava com o cheiro da febre do rato que nos latejava, misturado à pobreza que nos cercava, sujos e bêbados de um vinho que exalávamos e que nos bebíamos em goles fortes, e depois, voltávamos a realidade sobre o choque pífio de uma palavra chamada traição.

 Por que você quer fazer isso?

 Eu quero me enfiar dentro de você, primeiro a minha língua, só pra sentir o salgado sabor que vem de dentro da sua vagina, só pra você saber que o que foi feito, foi bem feito, foi o teu prazer, e teu passado também está entre as tuas pernas, é com teu passado que também me dá... Foi teu prazer.
Depois, o que eu quero é entrar em você, pra você levar no seu esquecimento alguma traição que tenha acontecido, e depois, quando estiver aberta em outra virilha, lava a sua sede e sua ânsia, deixando lavar este passado que se desenrola agora; através de ti, me uno a outros, e tu, através de mim, se une a outras. E depois, quando estivermos nus um sobre o outro, veremos ao nosso redor que haverá somente pobreza, somente a mendigaria com que a vida nos foi entregue, e até onde conseguimos levar.
Ela me olhou, na minha estúpida ânsia pelo sexo, não perguntei por que você quer fazer isso, de mim, talvez poesia, talvez somente meus dedos, ou minha língua, ou nada! Que eu não fizesse nada, e preservasse nela o quão criminoso seria seu ato.

Por que você quer fazer isso?

Eu tinha que falar... Falar... Apenas falar! Não me importo, eu também era um traidor, da minha consciência, da honra de ser homem, ou qualquer outra coisa, não me importo, eu nunca fui o homem que a sociedade desejasse que eu fosse, e nesta hora, eu era apenas o objeto dela, meu pênis já não me pertencia, nas mãos dela, eu era um bicho de carne, só de carne não basta, não basta ser só o corpo, e naquela hora, não nos bastaria que fosse somente corpo! E depois de gozar, rasgaremos nossa consciência traidora, mas enfim, vai se redimir quando o gozo dele vier e você se deixar invadida, e souber que pode possuir a quem pudesses ou quisesse amar, essa coisa libertadora, que não nos deixa esquecer, mas invariavelmente também não nos deixa lembrar. 

 - Por que você quer fazer isso?

Ela me corrompia a um romantismo que me custara caro, ou a uma realidade que um dia me fora pesada, a uma objetivação que já eu me perdia, e não era minha língua, era a dela, eu dizia palavras, mais era ela que encarnava a poesia, ela era quem expressava, e bebia do que vinha da minha pica.

  Por que você quer fazer isso?

Por que quero que me chame do nome dele, quero que penses nele e me chame do nome dele, do nome que quiseres me chamar, e que saía daqui mais apaixonada por quem quiseres estar, e depois, quando estiveres com ele, saberá que o amou mesmo em outro corpo, que o bebeu mesmo que em outro gozo. Mas nesta hora, já não era ela quem me chamava de outros nomes, era eu quem a chamava, eu que dizia, e gritávamos o nome de quem quer fosse, do Papa, dos Presidentes do mundo, Penélope Cruz. Marlon Brando, o vizinho da esquina, os que haviam nos traído e ali os perdoamos, e dizíamos com tanta força que o gozo se misturava com o choro, e dizíamos “eu te amo eu te amo eu te amo eu te amo...”.

Por que você quer fazer isso?

E acabamos rindo, pelados na bêbada da tarde, bêbados de vinho, gozando em todas as partes possíveis de nossos corpos, nos espalhando, afinal, eram corpos somente, naquela pobreza ao nosso redor. Choramos também nossas dores, todas as tristezas em nossos gozos, e a felicidade de dizer, aqui á alguém que em algum momento da minha vida pude amar.

Por que você quer fazer isso?

Ela por fim me perguntou, traíamos, nos traímos, nos olhamos, já havia sido dito, rimos, nos vestimos, nos beijamos, fechamos a porta do apartamento,  caminhamos até a estação, ela partiu, me pediu um segredo, eu prometi.

Por que você quer fazer isso?


Esta foi à pergunta que ficou, que não volta, saímos rindo, lavamos com amor qualquer traição, pode haver traição quando objetivo não é este? É mais traição? É menos traição? Poderíamos deixar de nos sentir tão felizes? Saímos inocentes, purificados novamente, essa pergunta, ainda vai me seguir, ainda fica comigo, como àquelas que estávamos conscientes do nosso subconsciente, que estávamos entregue, como se essa pergunta não tivesse sido feita, ou como resposta fora dado o silêncio... Por que você quer fazer isso?

Rio de Janeiro, 18/08/2015
Edgar de C. Santana

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