quarta-feira, 5 de agosto de 2015

Parte 12 - Treze Meses

Algo errado, ela não o procuraria naquele dia para saber de um dia de volta ao normal dele, tão pouco buscaria lhe trazer notícias de um mundo que já não o pertence... Será que foram essas notícias que a fizera lembrar-se dele? Será que fora alguma forma especial de vazio? Eu prefiro pensar que tenham sido todas as formas, um conjunto delas, repetidas e novas que sempre lhe atraem a um desconhecido, ou um conhecido que ainda lhe atraía o olhar sob formas desconhecidas.
Não havia algo errado então. Ela o procurava não por um erro, talvez por uma série de acasos que a movia e que às vezes nos leva a crer que é o destino... Ou então o próprio destino por ela tracejado nos seus rabiscos de cadernos, corações e flores no alto do cabeçalho. Um destino tracejado que ela própria criara, e que também podia afastá-lo... Afastar o corpo, não é o mesmo que afastar o destino de si. Pois mesmo um poeta, quando deixa de escrever suas poesias, ainda sim será chamado de poeta, não apenas pelo que escreveu, mas pelo que é, pela sua atitude, pelo seu olhar, e enquanto mais ela tentava se afastar disso, de uma poesia, por exemplo, mas se tornava poeta.
O desenhou não como ele era, mas como poderia ser. Ela o imaginou, talvez, soluçando em seus braços por um amor interrompido, o imaginou rindo sem motivos, rindo por rir, e que no final, o simples seria simples, o complicado, simples, o impossível simples, pois o simples poderia estar presente como qualidade, em qualquer um dos objetos, e seria simples para ele, por que tudo para ela era complicado, um real devaneio de sua cabeça, tinha forças para tudo, até para a simplicidade que o ecoara, só não aceitaria, que quando ela fosse simples, ele não visse simplicidade, e que esse ver dele complicado, estivesse nas características comuns das coisas, só que não com irregularidade.
Agora, ela lendo esse curto escrito, percebe que não é nada disso, que é mais simples do que eu, por exemplo, me coloquei a escrever, ela o procurou por procurar, para lhes saber de um dia que ela sabia que chegaria a ele, um dia normal, porém, diferente, uma volta algo ao normal, mas que duvido que para ele seja normal. Talvez, naquela hora do dia normal que ela dormia, ele estivera um tanto triste, uma tristeza que se misturava com a gratidão por dias anteriores, esse pé a pé entre a tristeza e a gratidão.
Mas ainda sim, havia o destino por ela tracejado, como quem diz “Amém” após uma oração, e ele sem entender, o “Amém” sente-se um vazio também, um “Amém” pode representar uma série de coisas, e na cabeça, era tão simples poder ser qualquer coisa, que afastara de sua mente a ideia de um “Amém” ser o mesmo que “desprezo”
Um destino tracejado com dedinhos infantis, um amém que poderia ser um “Eu te amo”, uma fotografia, uma pintura, uma poesia, uma música, e tudo o que pudermos expressar a esse destino desconhecido que nós tracejamos, ou ainda uma série de acasos que a levaria ao encontro, por um acaso, de seu destino tracejado.
“Por um acaso lembrei-me de você estes dias, especialmente lembrei de você hoje, de um modo distinto, tive vontade de soltar uma lágrima” essa lágrima que é uma representação comum a morte e a tristeza, mas que para ele era gratidão não escondida por trás da lágrima comum a morte e a tristeza.
“Lembrei-me de você estes dias...” Também poderia ser um destino por ele tracejado, quando desde a infância se colocara a tirar fotografias dos acasos que lhe cruzavam a vida. “Não poderia ser um acaso eu olhar justo esse tempo e espaço e registrá-lo?” é forte no pensamento brasileiro dizer: “Não cai uma folha sem a permissão dele...” Mas o lado forte às vezes é tão opressor, que ainda olhamos para um dito começo e nos lembramos... “um livre arbítrio” e tudo poderia ser melhor ou pior aos olhos Dele, e tudo poderia ser melhor ou pior aos nossos olhos... E excluindo a parte que cabe ao nós e ficarmos somente com o eu: “tudo pode ser melhor ou pior aos meus olhos...”
Então, quando ainda criança fotografara, por exemplo, a irmã pequenina matando a fome nos mamilos maternos; uma outra vez, fotografou-se nu, ainda com o pintinho pequenino e com fimose exposta, e ambas as fotografias lhe surgiam com um acaso. Porém hoje, quando conseguiu sua primeira autorização para fotografar uma transexual, ele havia fotografado o destino... E os acasos vieram a seu encontro.
Mas se o acaso viera... De onde? Havia um lugar? Onde poderia encontrar uma fábrica de fabricar acaso? Se ambos estivessem juntos teriam rido, só que eles não estavam mais juntos, e não tinham as repostas que eu observara em comum neles.
“Seja por acaso ou por destino, lembrei-me de ti esses dias”... Pode ser o mesmo que “não morre cedo”? Será estúpida essa leitura? Certa vez me disseram isso, e eu não dei importância; outra, quando me disse isso, estranhei! Não gostei que estivesse pensando, mas sim que estivéssemos nós dois pensando em mim e falando sem filtros o que havia para ser pensado, pelo menos naquela hora era o que eu desejava, afinal, não era um alguém que eu não dava importância.
Ele não disse “seja por acaso ou por destino, lembrei-me de ti esses dias”, era isso que desejava ter dito, mas não disse, trocou pelas palavras “não morre cedo...” Quer dizer a mesma coisa? “Não morre cedo” para quem não sabe, é um conceito para “estive falando de você, ou estive pensando em você! Era isso o que ele quis dizer... mas não disse, as palavras se confundem, afinal, há quem interprete de outra maneiram, como eu, um dia interpretei, por senti algo mais, por desejar algo mais... os homens e os sentimentos não são matematicamente puras.... nem as palavras o são!
Do mesmo modo, quando ela lhe respondera “Amém” fora por algo maior? Menor? Dito sem querer? Dito por consideração visto o poder da palavra “Amém”, para ele soara como uma ironia, um desprezo, isso doeu nele. Ele desejou que viesse uma pergunta, que não veio, e assim, nele se estabeleceu o vazio, preenchido pelos vários sentidos da palavra “Amém” num diálogo. Mas não prestou atenção, que ela poderia ter tido consideração pelo “não morre cedo...”. No entanto, o principal, foi que havia algo mais importante, para ela talvez, do que ele pensar nela que era o fato de procurá-lo! Ele não usou as palavras que havia sentido, mas conceituou o sentimento dele com outras palavras, o que se seguiu? Uma simples confusão em seus olhos...
Uma profundidade maior num diálogo, destinos desenhados, acasos, que não possuem uma fábrica, uma origem, pois se é para ser acaso, mesmo que seja repetido, que seja assim, um acaso, e que este acaso também não haja destino para ser dito acaso, ele não pipoca, ele surge, provando talvez que o nada existe, e para o nada volta. Ele uma vez achou que tivesse desenvolvido a teoria do nada... Muitos anos antes do seu nascimento havia uma obra publicada com o título o ser e o nada.

Destino? Acaso? Ela o procurou, ela o desejou, de alguma forma, ela lembrou que ele estivera dentro dela, partira dela essa abertura, essa ruptura, e assim, às vezes ela aparecia como um acaso que aparece e some. Ela surgia como o destino tracejado, nos rabiscos, nas letras tortas, nas primeiras canções de amor aprendidas, nas primeiras fotografias...

Edgar de C. Santana

Nenhum comentário:

Postar um comentário