quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

UMA MÃE


 

Ela não fala. Deixa-se por um tempo. Pensa no filho que só os outros podem ficar. Pensa no trabalho. Pensa nas discussões abortivas, pensa nas discussões maternas... No meio disso tudo ela está, assim como esses e outros caminhos estão no meio junto a ela.
“Às vezes a luta pelos direitos são mais simples que viver a liberdade. O problema nem sempre é a escolha, na verdade, quanto maior a possibilidade de escolhas, melhor. O problema é depois da escolha”
O telefone toca, ela liga e ligam de volta, enquanto fala, o suor toma o desenho dos lábios. Ela responde já mecânica, após tentar se fazer ouvida, em vão, ela tenta encontrar meios, interroga, exclama, analisa, diz, luta, explica. Eu vejo e penso: “Não é possível sermos sozinhos, a solidão não comporta multifaces... a solidão é a solidão, se manifesta de modos distintos, sobre uma mesma faceta”
Ela discorda, seu silêncio responde à Deus, à ausência, à todos, à morte e ao fumo, à vida e ao amor. Ascende o cigarro, lembra da ausência de saúde defronte uma morte iminente. Ela deixa que eu pegue em sua mão, mas meus dedos são grandes demais, são pesados e calejados, não é a minha mão que ela desejaria agora, e agora são tão poucos elementos, misturados a uma vontade reprimida.
Quatro meses com o filho e uma vida inteira se resume a um auxílio. Nós, machistas e feministas proletários andamos tanto... não é possível que quatro meses para uma vida inteira, ganhar dinheiro seja algo simples.
Nós machistas e feministas unidos! E as palavras dificultam. O pensamento subjetivo se interessa agora em se propagar subjetivamente, confundindo como ela confusa está. Ser um pensamento indeciso, por que de diversas fontes brotam amarguras, e no final de uma sentença, dizer-se: Pronto, já esqueci!
Uma vida inteira se resume a ganhar dinheiro. Criam-se novos feudos para isso, e novos escravismos sob a égide da desculpe esfarrapada de que escolhemos, de que optamos, quer dizer então que não posso ser mãe? Por isso condenam o aborto? Por isso desejam o aborto?
Confusão, nossos pensamentos, meu e dela se confundem. Eu sou um homem, ela é uma mulher, uma vida inteira vívida para um feudo. “Ah! que repostas busco? Será que olhar a essência basta?”
Não, é preciso mais. É preciso a solidão, cada um por si! Meu filho deve crescer sozinho, passando de mão em mão por cabeças que não sabem o que fazer com o filho dos outros... que roupa levar? Pode ir? Pode ser? “Sim, a decisão final é minha” e no fim, pergunta-se: onde está a mãe desta criança? Fala-se então do emprego, das dificuldades, que a mãe precisa ganhar dinheiro, estudar; mas sobre tudo, o que fica é a decisão final da mãe, e sobretudo, o que fica é a pergunta: Onde está a mãe dessa criança?
Nosso cotidiano é mesmo cheio de tragédias Gregas " Eu tenho que escolher entre não ser mãe, e não poder ser mãe; não ser mãe é também não poder ser mãe, resumindo não ter um filho presente em ambos os casos. E falo ser mãe em todos os casos, de todos os filhos que vivem no cadafalso da ausência de um e outro, e outros vivos, não importa a idade, não importa se a mãe será sempre chata e o filho sempre uma criança.
Ela sabe que a liberdade pode ser vista como um direito, mais também com um dever. Podemos olhar como um paradoxo, mas também como uma tragédia, uma conquista e um fardo. Liberdade é liberdade. Não possui faces, se manifesta em diversas formas.
 Mas é tão desigual, mãe é mãe. Mas será que todas as mães são iguais? Não somos iguais, e assim, mãe ganha multifaces. Ela nega as multifaces, por pensar e saber que mãe é mãe, mas que não são iguais, ela sabe que não é mãe como a mãe dela. Ela sabe que não é mãe como as outras mães.
No escritório ela liga para a avó do seu filho, pergunta-lhe pelos netos. Um retrato do pé do filho no canto da mesa. Pensa no filho, no emprego, quatro meses apenas. Foram apenas quatro meses... volve-lhes paradoxos de sua liberdade e solidão; situações conflitantes, escolha, opção.... Apesar de uma melancolia, ela olha o retrato, e um breve sorriso desponta e luta, algumas gotas de suor escorrem para seus lábios. Um breve sorriso desponta e luta.

 

Rio de Janeiro,09/07/2014
Edgar de C. Santana

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