Ela não fala. Deixa-se
por um tempo. Pensa no filho que só os outros podem ficar. Pensa no trabalho.
Pensa nas discussões abortivas, pensa nas discussões maternas... No meio disso
tudo ela está, assim como esses e outros caminhos estão no meio junto a ela.
“Às vezes a luta pelos
direitos são mais simples que viver a liberdade. O problema nem sempre é a
escolha, na verdade, quanto maior a possibilidade de escolhas, melhor. O
problema é depois da escolha”
O telefone toca, ela
liga e ligam de volta, enquanto fala, o suor toma o desenho dos lábios. Ela
responde já mecânica, após tentar se fazer ouvida, em vão, ela tenta encontrar
meios, interroga, exclama, analisa, diz, luta, explica. Eu vejo e penso: “Não é
possível sermos sozinhos, a solidão não comporta multifaces... a solidão é a
solidão, se manifesta de modos distintos, sobre uma mesma faceta”
Ela discorda, seu
silêncio responde à Deus, à ausência, à todos, à morte e ao fumo, à vida e ao
amor. Ascende o cigarro, lembra da ausência de saúde defronte uma morte
iminente. Ela deixa que eu pegue em sua mão, mas meus dedos são grandes demais,
são pesados e calejados, não é a minha mão que ela desejaria agora, e agora são
tão poucos elementos, misturados a uma vontade reprimida.
Quatro meses com o
filho e uma vida inteira se resume a um auxílio. Nós, machistas e feministas
proletários andamos tanto... não é possível que quatro meses para uma vida
inteira, ganhar dinheiro seja algo simples.
Nós machistas e
feministas unidos! E as palavras dificultam. O pensamento subjetivo se
interessa agora em se propagar subjetivamente, confundindo como ela confusa
está. Ser um pensamento indeciso, por que de diversas fontes brotam amarguras,
e no final de uma sentença, dizer-se: Pronto, já esqueci!
Uma vida inteira se
resume a ganhar dinheiro. Criam-se novos feudos para isso, e novos escravismos sob
a égide da desculpe esfarrapada de que escolhemos, de que optamos, quer dizer então
que não posso ser mãe? Por isso condenam o aborto? Por isso desejam o aborto?
Confusão, nossos
pensamentos, meu e dela se confundem. Eu sou um homem, ela é uma mulher, uma
vida inteira vívida para um feudo. “Ah! que repostas busco? Será que olhar a essência
basta?”
Não, é preciso mais. É
preciso a solidão, cada um por si! Meu filho deve crescer sozinho, passando de
mão em mão por cabeças que não sabem o que fazer com o filho dos outros... que
roupa levar? Pode ir? Pode ser? “Sim, a decisão final é minha” e no fim, pergunta-se:
onde está a mãe desta criança? Fala-se então do emprego, das dificuldades, que
a mãe precisa ganhar dinheiro, estudar; mas sobre tudo, o que fica é a decisão
final da mãe, e sobretudo, o que fica é a pergunta: Onde está a mãe dessa
criança?
Nosso cotidiano é mesmo
cheio de tragédias Gregas " Eu tenho que escolher entre não ser mãe, e não
poder ser mãe; não ser mãe é também não poder ser mãe, resumindo não ter um
filho presente em ambos os casos. E falo ser mãe em todos os casos, de todos os
filhos que vivem no cadafalso da ausência de um e outro, e outros vivos, não
importa a idade, não importa se a mãe será sempre chata e o filho sempre uma
criança.
Ela sabe que a
liberdade pode ser vista como um direito, mais também com um dever. Podemos olhar
como um paradoxo, mas também como uma tragédia, uma conquista e um fardo.
Liberdade é liberdade. Não possui faces, se manifesta em diversas formas.
Mas é tão desigual, mãe é mãe. Mas será que
todas as mães são iguais? Não somos iguais, e assim, mãe ganha multifaces. Ela
nega as multifaces, por pensar e saber que mãe é mãe, mas que não são iguais,
ela sabe que não é mãe como a mãe dela. Ela sabe que não é mãe como as outras
mães.
No escritório ela liga
para a avó do seu filho, pergunta-lhe pelos netos. Um retrato do pé do filho no
canto da mesa. Pensa no filho, no emprego, quatro meses apenas. Foram apenas
quatro meses... volve-lhes paradoxos de sua liberdade e solidão; situações
conflitantes, escolha, opção.... Apesar de uma melancolia, ela olha o retrato, e
um breve sorriso desponta e luta, algumas gotas de suor escorrem para seus
lábios. Um breve sorriso desponta e luta.
Rio de Janeiro,09/07/2014
Edgar de C. Santana
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